No dicionário, “saudade é sentimento melancólico devido ao afastamento de uma pessoa, uma coisa ou um lugar, ou à ausência de experiências prazerosas já vividas”. Saudade é uma das palavras mais presentes na poesia de amor da língua portuguesa e também na música popular e nesse momento em que o mundo enfrenta a pandemia do novo coronavírus, é uma das mais repetidas entre os que tiveram de se afastar de amigos, familiares, pais, mães, para evitar o risco de contágio, principalmente nos idosos.
Mas e o que fazer quando a saudade é tanta que um simples olhar, um abraço amenizam a tristeza por não poder ver a quem se ama? No município de Sobral, no Estado do Ceará, uma filha, encontrou uma forma de amenizar a saudade e a tristeza da mãe de 96 anos. Simone Alves teve a ideia, e juntamente com o marido, montou um painel com fotos dos tataranetos, bisnetos, netos e filhos da mãe, dona Maria de Jesus Alves. Hoje, é e nos quadros dispostos na sala de casa que a idosa passa parte do tempo vendo as imagens da família.
Com a pandemia, ela ficou muito triste. A tristeza foi amenizada com as fotos, como conta dona Maria de Jesus ao Eufemea. “Eu me senti muito feliz. Foi uma coisa que eu melhorei muito a minha cabeça, que tava muito perturbada, sem poder sair pra canto nenhum e sem meus filhos poder vir aqui. Passava o dia só e chorando e sem ver um filho, um neto. Tudo só por meio de telefone e tava ficando triste demais. Graças a Deus a Simone, a minha filha mais velha lembrou de fazer essa homenagem à mãe e se juntou com as outras irmãs e fez”, contou ao Eufemea, por meio de um vídeo, Maria de Jesus, que é lúcida e muita ativa na altura de quase um século de vida.
A filha Silvia Alves, 62 anos, saiu de Fortaleza e mudou-se para a casa da mãe, que mora em Sobral com outras duas filhas, Liduína, de 65 anos e Ila, 73 anos.
Mirla Dayanny Pinto Farias, é casada com um dos netos de dona Maria de Jesus. Ela contou a história de amor que poderia virar um livro, um conto, um filme. “Ela estava toda hora chorando com saudades dos netos e bisnetos. Ela tem 96 anos, mas é mais lúcida do que a gente. Tem uma saúde de ferro e gosta de se arrumar. Todos os dias quando acorda, se maquia, coloca brincos e perfume para esperar a família ir por lá. A filha mais velha, Simone juntamente com o esposo montaram o painel com as fotos e colocaram logo pela manhã antes que ela acordasse para ser uma surpresa. O painel está na sala da casa”, ela diz.
A ideia, relata Mirla, veio “no momento que notamos ela muito triste, chorando por tudo, com muita saudades e vontade de ver todos, pois ela é muito alegre e não queremos que esta pandemia a abale mais ainda por ser uma pessoa de auto risco pois tem 96 anos”.
Questionada se a ideia funcionou, Mirla responde: “Deu muito certo! Ela agora fica com uma lanterna para iluminar e ver melhor o rosto de cada um! Ela estava muito triste e agora Está ótima se achando muito feliz quer ligar para todos. E não para de ir olhar. Nas fotos estão os 12 filhos e suas famílias, que somam 20 netos, 29 bisnetos e 2 tataranetos”.
As alegrias e surpresas levadas à dona Maria de Jesus não ficaram por aí. “Depois de saber desta tristeza dela, e para animá-la, fomos até a calçada, para que de longe ela pudesse ver a nossa família”, lembra Mirla, ao dizer que dona Maria nasceu em 1924, em Canidé (CE), na Fazenda Marajo.
Saco plástico e abraço
Mesmo morando na mesma casa, a jornalista e funcionária pública Ana Paula Tenório passou três meses dentro do quarto. Temia contaminar os pais. No dia 10 de junho, data do aniversário da mãe Gileide Tenório, de 81 anos, não resistiu, ‘vestiu-se’ em um saco plástico e saiu do confinamento para abraçá-la e comemorar a data.
“Fiquei na dúvida se deveria sair de casa nesse período, mas conversando com infectologista e geriatra não me aconselharam sair não. Até porque só se eu saísse de vez, porque até produzirem uma vacina eu teria que ficar longe. E também iria ser pior para o emocional deles”, diz Ana Paula.
E conta: “Só que foram mais de 3 meses praticamente que fiquei no quarto, só saía para trabalhar e ir na cozinha. Só os via praticamente quando eu saía e chegava. Daí no dia 20 de maio eu apresentei uns sintomas leves e me isolei totalmente. Foi confirmada a Covid-19, graças a Deus foi bem branda. Cumpri os 14 dias”.
Dia 10 de junho, relata Ana Paula, “foi aniversário dela, aí como ainda estamos aguardando mais tempo pra todos fazermos a sorologia, eu arranjei aquele “modo” de dar um abraço na bichinha. Mesmo já tendo tido a doença, eu só terei total certeza q não levo perigo após todos nós de casa fazermos a sorologia. Daí fui de máscara com um saco de lixo pra não deixar de dar um abraço, desde fevereiro que eu nem chegava perto dela”.