Elas são chamadas de “irmãs” e fazem parte da maior facção criminosa do Brasil e América do Sul, o Primeiro Comando da Capital (PCC), que nasceu em São Paulo e se espalhou por todo País. A participação das mulheres nos quadros da organização cresce, chama atenção pelo modo de agir e é considerada determinante nas ações do grupo, embora o comando ainda seja dos homens.
O Eufemea conversou com a professora Elaine Pimentel, da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Alagoas (FDA/UFAL), doutora em Sociologia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), que traz uma análise sobre a participação da mulher no PCC. Segundo ela, o domínio ainda é masculino, mas há um protagonismo cada vez maior das mulheres.
Ela ressalta que “embora haja um protagonismo maior ultimamente, ele não é maior do que o masculino. Ainda existe uma divisão sexual do trabalho dentro das ações criminosas em que os homens comandam muito mais preponderantemente”.
De acordo com a professora-doutora, não há um diagnóstico sobre perfil de mulheres nas facções criminosas. “Eu não conheço nenhum estudo que tenha feito diagnóstico e nos presídios é muito difícil identificar isso. Poucas pesquisas falam sobre isso”, destaca.
Porém, Elaine conta que orientou uma pesquisa de TCC de graduação que mostra “que as mulheres atuam mais fortemente no PCC, mas o comando ainda é dos homens. Não podemos dizer que houve uma mudança total de paradigma”, diz a especialista, ao reforçar que “em Alagoas a facção dominante é o PCC. E aqui a gente tem dentro das unidades prisionais”.
Divisão sexual do trabalho
Elaine Pimentel lembra ainda que o “envolvimento de mulheres na criminalidade acontece em todas as sociedades, em proporções diferentes”. E ocorre principalmente nas sociedades que são marcadas por criminalidade violenta, relacionada ao tráfico.
A profissional diz que várias discussões em encontros jurídicos foram levantadas sobre a afirmativa de que as mulheres no tráfico atuam de forma mais violenta, mas ela pondera que “as mulheres não tendem a usar arma de fogo. Há uma tendência maior de uso de arma branca, as facas, punhais ou outros mecanismos, como água quente”.
É por isso, ressalta Elaine Pimentel, “que mulheres que praticam homicídio normalmente praticam com esse tipo de instrumento que tem essa conotação de maior crueldade, do que um projétil de arma de fogo que é um disparo até a distância, ou não, pode ser próximo, mas enfim, um disparo, que não implica um contato corporal tão imediato. Então, esses são relatos que acho que a gente ainda precisa estudar melhor para entender essa afirmação de que as mulheres são mais cruéis. Eu não iria por esse caminho, não. Eu iria pelo caminho das armas que estão à disposição das mulheres com mais frequência, que seriam as armas brancas, instrumentos cortantes, perfurantes, contundentes”.
Relações familiares e criminalidade
“A crescente incorporação das mulheres nas facções criminosas em presídios brasileiros” é o tema do trabalho de conclusão de curso de Kryslane Larissa Honório Mendes, na Faculdade de Direito de Alagoas (FDA). O trabalho foi orientado pela professora Elaine Pimentel e traz um diagnóstico da presença feminina no crime.
“Desde o início da minha graduação passei a frequentar o sistema prisional como participante do projeto Reconstruindo Elos, que promovia encontros nas unidades prisionais trazendo temas da área de cidadania, saúde, artes, etc”, conta Larissa Honório.
Segundo ela, que hoje atua como advogada, “semanalmente nós estávamos reunidos com as mulheres da Penitenciária Santa Luzia e me chamava atenção a facilidade com que elas nos falavam de suas vidas, suas histórias e a relação com o crime. Eu ficava impressionada com as peculiaridades da criminalidade feminina e decidi, ainda no início da faculdade, que meu TCC seria dentro dessa área. Com o passar dos anos fui acompanhando a ascensão das facções criminosas, então decidi unir uma coisa à outra”.
No contato com as presas, relata Larissa, “destaco a forma como as relações familiares foram determinantes para a entrada delas na vida do crime. Elas costumavam ressaltar a ‘necessidade’ de ajudar seus companheiros, filhos e irmãos nas empreitadas criminosas, fazia parte do seu ‘papel de mulher’ (falavam com orgulho disso). Era como se para elas fosse ‘uma prova de amor’ principalmente quando se tratava de familiares encarcerados”, conta Larissa.
Depois que concluiu a faculdade, em 2018, Larissa diz que não escreveu mais, “embora ainda me considere uma pesquisadora desse tema. Atualmente sou advogada e trabalho na área criminal, então continuo a frequentar o sistema prisional e a observar as faces da criminalidade feminina. Para mim é desafiador, eu acho um tema instigante, prazeroso e muito rico, por isso quero continuar essa pesquisa e com certeza farei outros trabalhos sobre este tema”, ela conclui.