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“Fico 24 horas no telefone, verificando se chega alguma notícia”, diz mulher que aguarda transplante de fígado em AL

Foto: Cortesia/Denis

“Já vai fazer um ano da minha última crise, e vou levando a vida esperando pelo transplante. Minha família me apoia muito, mas não é fácil viver a vida que nós, que precisamos do transplante, estamos vivendo”, desabafa Denis dos Santos, que está na fila para receber um transplante de fígado.

Ela relata que sua luta começou há sete anos, quando enfrentou um problema sério com varizes no esôfago. Inicialmente, Denis procurou tratamento em Arapiraca, mas suas crises continuaram, e sua condição hepática piorou.

A espera por um órgão adequado tem sido difícil, mas Denis agradece pelo apoio de sua família e amigos durante esse período desafiador. “Graças a Deus, minha família, meus amigos, meu marido, minha sogra, meu sogro e toda a minha família me apoiam nessa jornada pelo transplante. Meus amigos também têm sido muito solidários.”

Já a ansiedade é uma companhia constante na jornada de Denis. Ela relata que a rotina da espera é desafiadora e que frequentemente verifica seu telefone em busca de notícias sobre um doador. “Fico 24 horas no telefone, verificando se chega alguma notícia”, desabafa.

“Às vezes estou tão ansiosa que as meninas dizem ‘mulher, deixe tanta ansiedade, quando for pra ser, vai ser’. Eu digo ‘seja o que Deus quiser’, eu vou esperar até quando Deus quiser, quando for permitido por Deus. Vai chegar a minha hora”.

Mais de 500 pessoas aguardam por um órgão em AL

Mais de 500 pessoas aguardam na fila por um transplante de órgãos, de acordo com dados da Central de Transplantes de Alagoas. Esse número representa um aumento de 9% em comparação com os registros de todo o ano de 2022.

Conforme os dados, liderando as estatísticas da fila de transplantes em Alagoas, estão aqueles que aguardam por um transplante de córnea, somando 453 pessoas na fila. Em seguida, vêm os pacientes que esperam por um transplante de rim, totalizando 48, e aqueles que aguardam por um transplante de fígado, um grupo de seis pacientes.

Comparando o primeiro semestre de 2022 com o mesmo período em 2023, houve redução de 18 transplantes realizados de um ano para o outro, representando uma diminuição significativa de 35% no número de procedimentos realizados, segundo informações da Central de Transplantes.

“Conversar com os familiares é essencial”
Foto: Cortesia

Em uma luta contra a subnotificação de casos de morte encefálica nos hospitais, a Central de Transplantes de Órgãos de Alagoas tem a missão de salvar vidas por meio de doações de órgãos. Ao Eufêmea, a coordenadora da central, Daniela Ramos, disse que uma das principais dificuldades é a subnotificação de suspeitas de morte encefálica nos hospitais.

Ela enfatiza que, de acordo com o decreto 175/2017, todos os hospitais têm a obrigação urgente de notificar qualquer suspeita de morte encefálica à Central de Transplantes. No entanto, muitos hospitais ainda não cumprem essa exigência, o que dificulta o processo de doação de órgãos.

“Uma vez que é confirmada a morte encefálica e a família tem o direito de decidir sobre a doação, a subnotificação nos impede de avançar”, explica Daniela.

Ela enfatiza que a doação de órgãos é um processo complexo, e cada órgão requer uma abordagem específica. Daniela também destaca que a equipe médica responsável pelo paciente desempenha um papel fundamental nesse processo. “É o médico e sua equipe que determinam a necessidade do transplante, após esgotarem todas as opções de tratamento terapêutico possíveis”, afirma.

A coordenadora explica que, uma vez que um paciente é elegível para o transplante, a Central de Transplantes assume a responsabilidade pelo gerenciamento da lista de espera e da logística de compatibilidade entre doadores e receptores.

No entanto, a pandemia de COVID-19 trouxe desafios adicionais para a área de transplantes. A fila de espera cresceu consideravelmente, com mais de 500 pessoas aguardando por um órgão. A recusa familiar também aumentou no início de 2023, sendo um dos principais obstáculos para o aumento das doações de órgãos.

Daniela destaca a importância da conversa em família sobre a doação de órgãos. “Apenas a família pode autorizar a doação no momento da fatalidade”, enfatiza. Ela acredita que a educação contínua desempenha um papel fundamental na sensibilização da população e na capacitação de profissionais de saúde para lidar com as complexidades da doação de órgãos.

Dados da Central de Transplante apontam que durante o primeiro semestre de 2023, Alagoas testemunhou um declínio no número de transplantes, com exceção das córneas, que são consideradas tecidos. No entanto, em julho, houve um aumento significativo nas doações de córneas, com 15 transplantes realizados.

“Nós tivemos um aumento de mais de 60% e levamos em consideração a sensibilização da população e o trabalho que estamos fazendo como profissionais, estamos mais atentos e capacitados”, reforça.

Sala para busca ativa de possíveis doadores de órgãos
Foto: Cortesia

Para aprimorar o atendimento, proporcionar um ambiente acolhedor e atualizar a infraestrutura e os equipamentos, foi inaugurada a sala exclusiva para a busca ativa de potenciais doadores de órgãos no Hospital Geral do Estado (HGE) em Maceió. Nesse espaço, os profissionais terão a oportunidade de dialogar com os familiares de possíveis doadores de órgãos e tecidos

Eleonora Carvalho, coordenadora da Organização de Procura de Órgãos (OPO) no HGE, destacou que o HGE é o principal centro de onde provêm a maioria das doações de múltiplos órgãos e córneas em Alagoas. Ela enfatizou: “Nosso principal objetivo é oferecer o melhor suporte possível a essas famílias em um momento tão delicado, ajudando a esclarecer dúvidas e desmistificar tabus, com o propósito de aumentar as taxas de doação de órgãos e tecidos.”

Tabu após a doação

Ela avalia que o principal desafio que a OPO enfrenta na conscientização sobre a doação de órgãos é desmistificar o tabu quanto ao corpo após a doação.

De acordo com Eleonora, muitos acreditam que o corpo ficará deformado para o velório, mas isso não ocorre. “Muitas recusas ocorrem por desconhecimento do desejo da pessoa falecida quanto à doação, então precisamos estimular a população ao diálogo com seus familiares sobre esse tema, e em um momento dessa a decisão possa ser mais favorável”.

A coordenadora da OPO informa ainda os passos envolvidos desde a identificação de um potencial doador até a distribuição dos órgãos para os receptores adequados. “Nossa equipe identifica suspeitos de morte encefálica através de buscas e avaliações diárias nos setores com pacientes críticos ou ainda podemos ser informados via telefone”.

“Após essa suspeita, acompanhamos e validamos o protocolo de morte encefálica. Com o diagnóstico confirmado é avaliado a viabilidade para doação e caso seja, é nossa equipe quem faz a entrevista para a doação. Com a doação aceita a Central Estadual de Transplantes junto a Central Nacional é quem é responsável por essa logística e distribuição”, continuou.

Eleonora explica como a OPO lida com situações delicadas envolvendo a abordagem de familiares de pacientes em estado crítico sobre a possibilidade de doação. A coordenadora diz que a equipe encontra as famílias em momentos muito difíceis e procura acolhê-las. Nos casos de morte encefálica confirmada a família já tem um vínculo com a equipe facilitando uma tomada de decisão mais consciente.

“Uma família que tenha um melhor acolhimento, com espaço de escuta, com acesso ao conhecimento e esclarecimento de suas dúvidas será uma família com maiores chances de aceitar uma doação, nesse momento tão difícil e de dor, e assim teremos mais vidas salvas. Uma família com suporte emocional consegue de forma mais eficiente ressignificar a morte”, destacou a coordenadora.

“Fui agraciada com a bondade de uma doadora”
Foto: Cortesia

Márcia Costa, aos 60 anos, compartilha sua jornada que começou com o diagnóstico de uma doença renal crônica, chegando ao tão esperado transplante de rim. Ela descreve seu percurso, desde o diagnóstico até a cirurgia.

“O transplante foi realizado no dia 05/04/22. Descobri que tinha uma doença renal crônica na década de 90 e desde então comecei a fazer o tratamento conservador para retardar o avanço da doença.”

Durante anos, ela buscou estabilizar sua condição sob a orientação de nefrologista e nutricionista, adotando uma dieta cuidadosa. No período deste tratamento, ela trabalhava e considerava ter uma vida normal, evitando alimentos com alto índice de potássio, sódio e fósforo.

“Em janeiro de 2020, fui aconselhada por meu Nefrologista em fazer a cirurgia de fístula, devido a grande perda de minha função renal, evitando assim um atendimento de emergência e, na ausência da fístula, usar um cateter. Após a cirurgia, fiquei alguns dias de repouso e depois voltei ao trabalho”, comenta.

Mas, com a chegada da pandemia em março de 2020, Márcia notou uma reviravolta em sua saúde. “Em março, ficamos em home office, por causa da pandemia e percebi que minhas taxas melhoraram, daí solicitei o meu afastamento do trabalho definitivamente.”

Com a função renal chegando a apenas 5% em maio de 2021, ela foi encaminhada para a hemodiálise. Seu tratamento de hemodiálise começou em junho de 2021, marcando uma fase importante em sua jornada de saúde. “Minha amiga Mychella fez questão de entrar comigo, solicitando a meu esposo e segurou firme a minha mão, a ela toda minha gratidão.”

“Fiz hemodiálise por dez meses, sempre indo conformada e sem tristeza com a situação, pois sabia que a máquina possibilita a minha sobrevivência. No período, fiz muitas amizades (aqui destaco a minha amiga Eliana, que continua no tratamento) e animava a turma que fazia o tratamento comigo”, continua.

A aguardada oportunidade de um transplante finalmente chegou, e Márcia destaca a importância de ser doador de órgãos.

“Não tinha doador vivo, assim fiquei na fila aguardando uma possibilidade. Fiz a opção por Maceió, por causa da facilidade da logística. Todos falaram que seria melhor ter optado por São Paulo ou Recife, pois aqui seria demorado. Eis que após 10 meses de tratamento, precisamente no dia 05/04/22, fui agraciada com a bondade de uma doadora e seus familiares, com o transplante que me tirou do tratamento e da fila de espera.”

“A todas as pessoas conscientes da importância da doação de órgãos, meu sincero agradecimento. Que Deus as abençoe imensamente, vocês estão em minhas preces. Meu período de espera foi relativamente curto, e agradeço a Deus por isso. Reconheço que tudo tem um propósito, e desejo honrá-lo.”

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Rebecca Moura

Estudante de Jornalismo pela Universidade Federal de Alagoas e colaboradora no portal Eufêmea, conquistou o primeiro lugar no Prêmio Sinturb de Jornalismo em 2021. Em 2024, obteve duas premiações importantes: primeiro lugar na categoria estudante no 2º Prêmio MPAL de Jornalismo e segundo lugar no III Prêmio de Jornalismo Científico José Marques Melo.