Aos 12 anos, o talento de Nadeje Fidelis na área da educação já era notável. Nessa fase, ela se destacava na catequese, ensinando os conceitos religiosos. Desde então, a educação se tornou uma parte fundamental de sua vida e se transformou em uma poderosa ferramenta de mudança social.
Ao Eufêmea, a professora alagoana conta sua trajetória e os desafios enfrentados como uma educadora negra. Ela disse que “como mulher negra, ela enfrentou e ainda enfrenta uma série de preconceitos”.
A história
Filha de um pescador que extraia sururu da Lagoa Mundaú e de uma doméstica do lar, a expectativa dos seus pais era que ela terminasse apenas o ensino médio. Eles não esperavam que Nadeje se tornasse uma psicopedagoga especialista em educação infantil, que hoje acumula 37 anos de experiência.
A professora relata que estudou por conta própria para passar no vestibular e cursar pedagogia na UFAL, mas foi vítima de racismo estrutural logo na graduação.
Por outro lado, outros professores a incentivaram a insistir no seu sonho e serviram como alavanca profissional.
“Uma figura de destaque na minha graduação foi a professora Maísa Brandão. Ela sempre frisava o quanto eu tinha capacidade de ir além da graduação, me encorajando a fazer o mestrado, não porque gostava de mim, mas porque reconhecia que eu era uma estudante dedicada e que sabia escrever bem”, aponta Nadeje.
Ao chegar no mercado de trabalho, as oportunidades nem sempre estavam ao seu favor. Mesmo com o diploma na mão, a capacidade da professora ainda era questionada e ela continuava sendo vítima de racismo.
“Eu lembro que deixei o currículo em uma escola particular e no mesmo dia fui chamada para a entrevista. Naquele tempo, não tínhamos essa facilidade de conhecer as pessoas por foto, como fazemos hoje pelo WhatsApp, e quando a diretora da escola me viu, mudou totalmente. Ela me fez umas perguntas fora do contexto e disse que eu não estava apta para o cargo.” exemplifica a pedagoga.
“Como mulher negra não me sinto especial, me sinto igual às outras pessoas”
Nadeje conta que desde criança reconhece a importância da sua negritude, porque um primo do quilombo de Santa Luzia explicou que sua família era descendente de um povo forte e batalhador e, por esse motivo, havia a necessidade de se orgulhar.
Trazendo suas vivências para a sala de aula, a professora destaca que é fundamental explicar para as crianças o que é a cultura negra e quem são os povos africanos, porque, desse modo, a criança ganha desde cedo a força que precisará para enfrentar os possíveis obstáculos.
Para a professora, essa autoestima e aceitação de raça influenciam até no processo de aprendizagem. “Quando uma professora negra se aceita como ela é, as crianças percebem. Elas também começam a sentir orgulho de si mesmas, usando o cabelo cacheado solto, e a se reconhecer como professora, almejando outras oportunidades, além daquelas que os seus pais ocupam”, afirma Nadeje.
Inclusive, o orgulho de ser negra foi o que deu força à professora para seguir adiante.
Durante sua trajetória, Nadeje ensinou em diversas escolas públicas e privadas e atualmente leciona no curso de pedagogia da Faculdade da Cidade de Maceió (FACIMA).
Atualmente, a pedagoga não trabalha diretamente com crianças, mas é formadora regional de um projeto do governo federal chamado “Criança Alfabetizada”, que busca garantir a recomposição das aprendizagens com foco na alfabetização. Agregada a esse projeto, a pedagoga ministra formações para os articuladores de ensino, com o objetivo de as metodologias de alfabetização cheguem até os professores.
“Eu procuro sempre deixar para os meus estudantes e para os professores que é através do estudo que temos possibilidades de crescimento, encontrando o espaço que cada um tem por direito”, completa.