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Advogadas de Alagoas comentam vídeo de professor que incita crime contra mulher: “asqueroso e desumano”

Foto: Cortesia

O ex-policial militar e professor de Direito Penal, Evandro Guedes, gerou repúdio nas redes sociais, nesta segunda-feira (4). Em um vídeo que viralizou, o fundador da escola preparatória para concursos públicos, Alfacon, aparentemente incita ao crime de vilipêndio de cadáver afirmando que vale a pena responder pelo ato quando se está diante de uma ‘mulher com um rabão’ e ainda ironiza os familiares da vítima.

No vídeo, Evandro aparece explicando o seguinte exemplo:

“Imagina que você é virgem ai ‘cê’ passa num concurso técnico de necropsia de nível médio. Aí cê tá lá e vem uma menina do Pânico na TV morta, meu irmão, com aquele ‘rabão’ e ela infartou de tanto tomar bomba, na porta do necrotério. E levou lá pra dentro duas horas da manhã, não tem ninguém. ‘Cê’ bota a mão, ‘hum.. quentinha ainda’, que que cê vai fazer, vai deixar esfriar? Meu irmão, eu assumo o fumo de responder pelo crime”.

Foto de internet de Evandro Guedes em live de pronunciamento

E continua ilustrando a cena. “O difícil vai ser arrumar uns travesseiros porque ‘comer’ ela de bruço não dá, tem que botar ‘de quatro’. Então, cê bota um monte de travesseiro, bota ela toda torta daquele jeito, fica meio durinha, vai corrigindo e só por Deus cara, e como vai endurecendo tudo vai ficar bom demais. E come até a parte da manhã, até esfriar. E depois que esfriou liga a porra de um secador de cabelo e avisa ao cara que vai te render: “deixa que eu vou tirar de plantão para você” e é o dia mais feliz da sua vida, irmão!

E finaliza ironizando o sofrimento da família e a pena do crime. “É crime? É. Cê mexeu com a honra do cadáver, o sujeito passivo do crime é a família da vítima. Cê imagina o pai da vítima ‘ai, minha filha morreu e o cara de 19 anos, aluno do Evandro, conseguiu botar minha filha morta pra chupar o pau’.  A pena é ‘desse tamanhozinho’ (numa acepção de ‘pequena’), vale a pena responder”.

Pronunciamento

Não satisfeito com o resultado do vídeo, o ex-PM fez uma transmissão nas redes sociais e negou que tenha defendido o cometimento do crime. “Defendendo abuso de mulheres? Primeiro que, se ela está morta, ela não é mulher. É um defunto, não é uma pessoa viva. Ela não tem mais personalidade jurídica, porque ela morreu […] Isso é uma ficção jurídica, é um exemplo”, afirma.

Evandro também chamou os críticos de “burros” ao afirmar que a ilustração era apenas exemplo e que não foram capazes de compreender sua atuação como professor. Ele aproveitou para corrigiu as alegações de estupro, dizendo que, na verdade, se trata de vilipêndio de cadáver.

“Asqueroso e desumano”

O Eufêmea conversou com duas advogadas sobre a repercussão do caso. Para Carolina Guerreiro, as palavras, mesmo que ‘ilustrativas’, são estarrecedoras.

“É muito difícil ser mulher na sociedade em que vivemos, e algumas vezes é impossível lidar com o horror das situações que se apresentam. É asqueroso e desumano. Fica evidente a banalização da violência e o estímulo de uma parcela da sociedade a achar que não tem nada demais pensar assim”, pontua.

Carolina Guerreiro

A advogada pública alerta ainda para o fato de estarmos diante da fala de um professor, um propagador de informações e formador de pessoas.

“Deveria usar de seu lugar de privilégio para disseminar a mudança de atitudes, incentivando a luta contra a violência, contra o machismo, a misoginia, mas não, ele usa de sua bancada para ensinar que uma mulher, mesmo que já esteja morta, nada mais é que um objeto disponível para o prazer do homem. Além disso, ele também é um ex-policial, ou seja, deveria estar em uma posição de nos proteger, de coibir a prática de crimes, mas não, de novo ele minimiza o crime que ensina a praticar”. E completa: “e veja só, ele é pai de uma moça. Fiquei pensando como ele se sentiria se alguém falasse da filha dele como ele falou”.

“Traz consequências legais”

Advogada familiarista e professora de direito civil, Raphaela Batista aproveita para chamar atenção para a proporção que tomam hoje, discursos machistas e misóginos como este e a consequente descredibilização da mulher numa época onde é possível se utilizar da internet para manifestar tão facilmente o pensamento.

“O direito fundamental da liberdade de expressão não é ilimitado. A partir do momento em que eu violo o direito de outra pessoa ou eu acabo incitando o cometimento de um crime, então, nesse caso, eu estou sujeito a todas as consequências legais da corrente desse meu ato, a responsabilização civil e o pagamento de indenização e a responsabilização criminal inclusive quanto a incitação do discurso de ódio”.

Advogada Familiarista e professora de direito, Raphaela Batista

Ela lembra que tal possibilidade de responsabilização se estende após a morte, especialmente em se tratando de uma vítima mulher. “Os direitos de personalidade podem ser tutelados para após a morte, principalmente no caso de uma mulher, de uma criança ou uma pessoa que já é mais vulnerabilizada. Então, os seus familiares passam a ser titulares desse direito”.

O que diz a empresa

Após a repercussão negativa, a AlfaCon afirmou em nota que o “vídeo foi editado de forma a parecer que o professor em questão era praticante do crime”.

O vídeo completo, conforme a instituição, deixa claro se tratar de um “exemplo fictício e caricato para ilustrar uma situação do direito penal”. E continua: “O vídeo é antigo, uma aula ao vivo do YouTube que foi retirada do ar para que nenhuma pessoa mais faça mau uso do conteúdo e em respeito a todos que possam se sentir ofendidos com a colocação”, comunicou a empresa.

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Meline Lopes

Jornalista, advogada, especialista em comunicação e em marketing digital. Atuou como repórter de televisão durante 9 anos em diversas emissoras do Brasil. É repórter do Eufêmea.