Uma pesquisa dos Institutos Locomotiva e Patrícia Galvão revela que oito em cada dez mulheres brasileiras adotam medidas de segurança ao se deslocarem, por medo de sofrer algum tipo de violência. Os dados ainda indicam que 74% delas já foram vítimas de assalto, agressão física, estupro, importunação, assédio sexual, discriminação ou racismo.
O Eufêmea conversou com duas mulheres que utilizam estratégias na rotina para driblar a insegurança no ambiente urbano, além da coordenadora das Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs), a delegada Ana Luiza Nogueira.
“Eu sempre fico em alerta”
A alagoana Sarah Carnaúba, jornalista, relata que ao sair de casa, mantém-se sempre em estado de alerta. Uma das medidas que costuma adotar é compartilhar a sua localização com amigos e familiares, por receio de desvios de rota.
“Sinto que estou em risco, então sempre fico em alerta. Costumo compartilhar a minha localização com amigos e familiares quando saio de carro por aplicativo. Já aconteceu inclusive uma situação com um Uber; às vezes, eles acham que só porque estamos sendo simpáticas, queremos ficar com eles”, diz.
A jornalista ainda compartilha a experiência no trânsito com o carro próprio, o que também implica na adoção de medidas de segurança. Ela disse que tem percebido algumas situações machistas no trânsito, simplesmente por ser mulher. “Querem cortar o sinal, me ultrapassar e até me apressar em situações descabidas”.
E citou como exemplo: “Aconteceu uma vez de vários carros estarem seguindo em linha reta para subir o Farol, quando, na fila paralela, um deles quis passar na minha vez. Ele começou a buzinar muito e até a me xingar de “rapariga”, quando não o deixei passar. No entanto, os homens atrás de mim, que também não deram a vez, não foram xingados nem buzinados”.
Por esse motivo, Sarah resolveu aplicar fumê nos vidros do carro como estratégia de segurança, a fim de preservar sua integridade. “Coloquei fumê porque agora eles não sabem quem está dirigindo, se é homem ou mulher. Também porque o fumê evita furtos e assaltos no banco de trás, por exemplo. Depois disso, percebi que melhoraram bastante essas confusões no trânsito”, pontua a alagoana.
“Já sofri importunação no ônibus”
Ylailla Moraes é também outra alagoana que vem adotando medidas de segurança ao sair de casa. As estratégias incluem a localização fixa, compartilhar trajetos de corridas de aplicativos e evitar o uso de fones de ouvido nas ruas.
“Eu uso um recurso do Google que permite aos meus familiares e amigos o acesso à minha localização fixa, ou seja, a minha localização 24 horas por dia. Além disso, sempre que pego Uber, compartilho a rota com alguém que está em casa ou com a própria pessoa com quem vou sair. Também evito usar fones nas ruas para não ficar distraída”, detalha ela.
A estudante também menciona que em festas e baladas adota métodos específicos. Fica em alerta por si e pelas amigas e evita sair do ambiente com pessoas que não confia.
“Se alguma estiver bêbada, o cuidado é redobrado. Também deixo sempre minhas coisas por perto, não aceito bebidas e não confio em ninguém para sair do ambiente comigo”, disse.
“Outra medida que já adotei e que muitas mulheres também utilizam é dizer que tenho um relacionamento, para que o ‘não’ seja respeitado e parem de insistir”, complementa.
Segundo Ylailla, sua preocupação ao circular pelas ruas da cidade não é apenas ser vítima de assalto ou furto, mas também enfrentar situações de importunação, assédio sexual e até mesmo estupro.
“Acredito que fomos criadas em estado de alerta o tempo inteiro, por nós e pelas mulheres que amamos. Então, é algo que virou rotina. Eu já sofri importunação sexual no ônibus. E parece que ficamos ainda mais em risco quando o transporte está vazio, porque esses abusadores se aproveitam para fazer elogios desconfortáveis e puxar conversa”, comenta.
Suspeitou de algo? Denuncie!
“A medida mais importante é a denúncia”, é o que diz a delegada de polícia Ana Luiza Nogueira, especialista em violência de gênero. Segundo ela, algumas medidas podem ajudar, como compartilhar a localização, mas denunciar continua sendo a mais adequada.
“Essa denúncia é fundamental para garantir a punição do agressor, eles precisam ser responsabilizados, e tudo isso inicia com a denúncia. As medidas têm que ser focadas no próprio homem, respeitando a mulher e considerando-a como sujeito de direito e não objeto”, afirma ela.
A delegada ainda frisa que as denúncias agora podem ser feitas de maneira virtual. “O próprio boletim de ocorrência pode ser feito de maneira virtual. Aqui em Alagoas, ele pode ser feito através do site da polícia civil, sem a vítima precisar sair de sua residência. Inclusive, o requerimento da medida protetiva de urgência também pode ser feito por lá”, esclarece Ana.