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Podemos eleger mais mulheres em 2024?

O ano de 2024 marca o período das eleições municipais no Brasil. Apesar de as mulheres constituírem a maioria da população, a representatividade no meio político ainda é baixa e marcada por vários desafios. Será que conseguiremos eleger mais mulheres este ano?

O Eufêmea conversou com Malu Fontes, jornalista, mestre e doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas (PósCom), e com Monalisa Torres, doutora em Sociologia, mestre em Políticas Públicas e professora de Teoria Política da UECE. Monalisa Torres também é pesquisadora do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia e integra a Diretoria Regional da Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP – Regional Nordeste).

Ela não acredita que possamos ter mais mulheres eleitas em 2024, mas também não acredita em retrocesso ou diminuição. “Não estou abordando isso de forma pessimista, conservadora, ou acreditando em retrocesso, de modo algum. Não acredito que haja retrocesso. Temos avançado, é um progresso contínuo, mas não é um avanço significativo”.

Malu afirmou que consideraria um aumento significativo se tivéssemos um avanço considerável em pautas muito importantes para mulheres e se houvesse mais parlamentares em todas as esferas dos legislativos municipais, estaduais e federais. “Mas ainda temos um contingente muito pequeno de representatividade”.

E por qual motivo isso acontece?

Malu Fontes. Foto: Cortesia

Ela menciona que existem várias explicações, sendo uma delas o fato de os detentores desse poder, ou do pequeno poder, no caso das cidades pequenas, serem majoritariamente homens. Além disso, destaca a persistência da falsa representatividade.

“O que eu chamo de falsa representatividade? Muitas vezes, infelizmente, algumas mulheres são eleitas apenas porque têm o ‘privilégio’ de serem irmãs, filhas, mães, ou parentes de homens poderosos, como prefeitos, ex-prefeitos, ex-governadores, ex-deputados, que ocupam os espaços de poder para preencher as cotas partidárias.”

Sobre os obstáculos que as mulheres que desejam ingressar na política podem enfrentar, Malu Fontes afirma que são os mecanismos de concentração de poder dos homens nas máquinas partidárias. Os diretórios dos partidos, as convenções, tudo que se refere ao núcleo originário da política eleitoral partidária ainda está, em grande parte, concentrado nas mãos dos homens.

“O valor ainda atribuído, as decisões dos homens, as escolhas masculinas são muito predominantes. Muitas vezes, até imaginamos e atribuímos a baixa representatividade feminina somente ao eleitorado. E eu não estou dizendo que não é o eleitorado que escolhe ainda majoritariamente homens. Sim, é o eleitorado. Por quê? Porque um percentual muito maior de mulheres se candidata, mas o percentual de mulheres eleitas em relação ao conjunto de eleitos ainda é muito pequeno.”

A segunda dificuldade, de acordo com ela, ainda faz parte de uma cultura política brasileira, que é imatura, especialmente do ponto de vista da representatividade. “Ter uma equivalência, uma igualdade de homens e mulheres, é o desafio que discutíamos anteriormente, e isso reflete no eleitorado, que ainda vota majoritariamente por gênero, escolhendo predominantemente os homens”.

Pequenos avanços…

Monalisa Torres. Foto: Cortesia

Já Monalisa Torres acredita que teremos avanços no meio político e associa isso às mudanças na legislação e ao maior conhecimento da mulher em relação aos seus próprios direitos e aos espaços que ela pode ocupar na política.

“Eu acredito que teremos avanço, sim, não apenas na quantidade de candidaturas femininas, pois agora temos uma regra que pune os partidos em relação a isso, mas também pelo próprio entusiasmo e protagonismo das mulheres em diferentes esferas”, disse.

Ela afirmou que os resultados ainda aparecem de maneira tímida por agora, mas que a longo prazo o reflexo será mais significativo. No entanto, a mulher ainda enfrenta alguns obstáculos. “Inclusive, eu gosto de abordar esses obstáculos em relação à mulher na política em três dimensões, em três tempos: o antes, o durante e o depois da política”.

Segundo ela, antes da política há todo um desafio que está relacionado com a própria organização da sociedade. “A mulher ainda é aquela que é responsável pelos cuidados da casa, pelos cuidados culturalmente designados. Existem vários preconceitos do ponto de vista estrutural que acabam impedindo as mulheres de ocupar e participar da política. Então, eu acredito que esse é o primeiro tempo.”

O segundo tempo está relacionado ao próprio processo eleitoral, já que existem alguns casos de violência política de gênero. “Durante as eleições, há outra questão que também se relaciona com a própria organização dos partidos. Os partidos ainda são muito resistentes; ainda existem muitos partidos resistentes, e é muito prejudicial esse discurso de igualdade de gênero dentro dos partidos.”

O terceiro tempo é quando elas entram. “E aí há também um conjunto de outras violências de política de gênero que elas enfrentam durante o processo de exercício dos seus mandatos. Então, acho que precisamos pensar quando falamos sobre mulher, falamos sobre política, falamos sobre a ampliação dos espaços da mulher na política, temos que equacionar esses problemas durante esses três tempos.”

Fonte: Censo das Prefeitas Brasileiras

O que fazer para melhor esse cenário?

A pesquisadora acredita que a legislação poderia ser mais incisiva em relação à ampliação desses espaços. “Há um debate, inclusive, no nosso parlamento, liderado pela bancada feminina, sobre a possibilidade de discutir não apenas cotas para mulheres durante as eleições, porque o que a justiça, a nossa legislação, faz basicamente é isso: ela delibera, define um percentual de cotas para candidaturas e, obviamente, destina recursos para que essas candidaturas sejam viabilizadas, o que também é um problema.”

Ela diz que o que deveria ser feito, que poderia ser mais eficaz, é não pensar nas cotas para candidaturas, mas nas cotas de vagas.

“Isso seria uma medida mais efetiva, garantiria, a curto prazo, que mais mulheres ocupassem mais espaços. Há outros países que adotam essa medida e têm dado bons resultados. E isso, quando pensamos na qualidade da democracia, é fundamental. Quanto mais plural é uma sociedade, mais plural também deve ser o seu parlamento, porque isso reflete essas diferentes perspectivas de sociedade.”

Dados que vocês precisam saber

Uma Pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV) mostra que as mulheres são as mais interessadas pelo tema no ambiente digital: são 50,4% contra 49,6% dos homens.

As mulheres são 51,1% da população brasileira, mas, na política, os números não refletem essa maioria.

Nas últimas eleições, o País consolidou um número recorde de mulheres no Senado, somando 15 parlamentares, mas ainda longe da metade do total de 81 cadeiras.

Na Câmara, as deputadas representam apenas 18% das 513 vagas, mesmo com o aumento de 41% nas candidaturas nas eleições de 2018 para 2022.

De acordo com a recente pesquisa do Instituto Alziras, na última eleição municipal, 673 mulheres foram eleitas prefeitas.

Já para as câmaras municipais, foram 9.196 vereadoras eleitas.

Raíssa França

Raíssa França

Cofundadora do Eufêmea, Jornalista formada pela UNIT Alagoas e pós-graduanda em Direitos Humanos, Gênero e Sexualidade. Em 2023, venceu o Troféu Mulher Imprensa na categoria Nordeste e o prêmio Sebrae Mulher de Negócios em Alagoas.