O peso da maternidade é desafiador. Ser mãe e conceber uma vida é linda, mas também é um desafio enorme para qualquer mulher. Desde a concepção até a vida adulta dos filhos, nos deparamos com a realidade de sacrificar parte de nossa existência para viver em função de outro ser humano. A vida é complexa e traz consequências. E penso se, uma criança de 10 anos que foi estuprada, poderia ter essa capacidade.
Não digo somente física e mental para suportar o peso da maternidade. Sem adentrar muito no assunto, mas com o intuito de chamar atenção para capacidade financeira também, ora, uma menina de 10 anos não pode sequer trabalhar no Brasil, quando o trabalho é realizado na condição de aprendiz, é permitido a partir dos 14 anos. Como poderia sustentar e prover uma outra criança? Uma nova família?
Como se não bastasse tudo isso, as meninas na infância muitas vezes não entendem bem o que está acontecendo com seus corpos quando se veem grávidas. Muitas não buscam ajuda por medo ou vergonha, devido às mudanças naturais que começam a ocorrer em seus corpos. Não se pode esperar dela prontidão para denunciar um estuprador, que muitas vezes é da própria família, e pleitear um aborto legal na justiça.
Ela só se verá obrigada a tomar uma decisão quando as dores em seu corpo se tornarem insuportáveis, quando perceber que será impossível esconder tudo por muito mais tempo, e tomar consciência de que seu direito de ser criança está se acabando.
O Projeto de Lei 1904/24 que propõe um prazo máximo de 22 semanas para a interrupção da gravidez e, isso nada mais significaria que, passadas 22 semanas, a mulher, ou menina, perderia o direito de pleitear a interrupção da gravidez, e recairia sobre ela a responsabilidade por não tê-lo feito dentro deste prazo, recaindo também sobre ela imediatamente o dever de tornar-se mãe, e dedicar o resto da vida a criar o filho de um estuprador.
É muito agressivo. Não podemos nunca olhar isso como uma provação ou tribulação. Estuprar é um crime bárbaro que causa um dano irreversível. Estuprar e engravidar uma menina é ainda mais do que isso. É uma monstruosidade incomensurável, sobre a qual nós mulheres estamos sendo obrigadas a nos debruçar por causa de um projeto absurdo, fora de propósito.
Mas é preciso que os homens se manifestem contra tal absurdo. Li em um texto de Jamil Chade que a responsabilidade de quebrar paradigmas também é dos homens e, de fato, é de toda a sociedade. A evolução precisa ser constante.
Como evoluímos com um projeto de tal natureza? O corpo de uma mulher e suas decisões, que podem afetá-la em diversas áreas da vida, não podem ser limitadas. Aos 8,10,15,20,30 não fazemos abortos porque é mais fácil, é uma decisão que nos consome, que dilacera o coração, mas, muita vezes é necessária.