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Lei Maria da Penha se estende a casais homoafetivos e mulheres trans; entenda os desafios e avanços

(Tempo de leitura: 4 minutos)

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unamidade, estender a aplicação da Lei Maria da Penha para casais homoafetivos formados por homens e mulheres travestis e transexuais. A Corte concluiu que há omissão do Congresso Nacional em legislar sobre o tema.

Ao Eufêmea, a advogada Sandra Gomes destaca que um dos principais impactos da decisão é a reafirmação da identidade de gênero. “O STF acaba por reafirmar que mulheres trans são mulheres e, portanto, devem ter acesso às mesmas proteções que mulheres cisgênero em caso de violência doméstica e familiar”, diz.

Desafios e tratamento discriminatório

Foto: Cortesia ao Eufêmea

Antes da decisão do STF, pessoas dessas comunidades enfrentavam diversas dificuldades para acessar as medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha. Segundo Sandra Gomes, interpretações restritivas da legislação e o preconceito institucional dificultavam a concessão dessas proteções.

“Muitos juízes e delegacias negavam a aplicação da Lei Maria da Penha em casos de violência entre casais lésbicos ou envolvendo mulheres trans, alegando que a lei se destina apenas a relações entre homens e mulheres cisgênero”, explica.

Além disso, o despreparo das autoridades e o tratamento discriminatório eram apontados como entraves ao registro de ocorrências e à obtenção de proteção. “Muitas vítimas relatavam o tratamento discriminatório ao procurar as delegacias especializadas ou serviços de proteção”, acrescentou.

No entanto, a advogada alerta que a decisão do STF pode enfrentar resistência dentro do próprio sistema judiciário, especialmente por magistrados com interpretações conservadoras sobre a definição de mulher e de violência de gênero. “Alguns magistrados e membros do sistema de justiça ainda possuem uma visão restritiva e tradicionalista do conceito de mulher e do conceito de violência de gênero”, explicou.

Entre os desafios futuros, Sandra Gomes aponta a necessidade de fiscalização e treinamento dos órgãos responsáveis pela aplicação da decisão. “Implementar a decisão do STF na prática ainda exige fiscalização e treinamento dos órgãos responsáveis”, diz.

A advogada ressalta que o Congresso pode aprovar uma legislação que formalize essa inclusão, reduzindo possíveis resistências. Além disso, estados e municípios precisam estruturar políticas específicas para atender a população LGBTQIA+ no contexto da violência doméstica.

Construção de um país mais inclusivo

A decisão do STF representa um avanço na construção de um país mais inclusivo, mas, segundo Sandra Gomes, sua efetividade dependerá da implementação de medidas concretas. “A ampliação da Lei Maria da Penha é mais um passo na construção de um país mais inclusivo, mas precisa ser acompanhada de medidas concretas para garantir a efetividade”, afirmou.

A advogada Emilly Vieira também destacou que a medida representa um marco para a comunidade LGBTQIA+, garantindo segurança jurídica a grupos que, até então, não eram contemplados pela legislação específica.

“Essa decisão contribui para a erradicação da violência de gênero, ao reconhecer que a vulnerabilidade não está restrita ao sexo biológico”, afirmou.

A decisão do STF reflete um avanço no reconhecimento da violência sofrida por casais homoafetivos e mulheres trans no ambiente doméstico, muitas vezes invisibilizada pelo sistema de justiça. Vieira ressaltou que estudos indicam altos índices de violência contra essas populações, agravados pela discriminação estrutural e pela falta de acesso a políticas públicas eficazes.

Antes da decisão, a ausência de reconhecimento legal era um dos principais desafios enfrentados por essas populações ao buscar proteção contra a violência doméstica. A advogada destacou que o Congresso Nacional tem sido omisso na regulamentação de direitos para homens GBTI+ que sofrem violência, o que cria barreiras na busca por proteção.

Investir em capacitação

Foto: Cortesia ao Eufêmea

Apesar do avanço, a advogada alertou para possíveis dificuldades na aplicação da decisão, incluindo resistências por parte de agentes do sistema de justiça. “É essencial investir na capacitação contínua de magistrados, promotores, defensores públicos e agentes de segurança pública, garantindo que compreendam corretamente a extensão da decisão do STF”, ressalta.

Além disso, Vieira defende a implementação de campanhas de conscientização para informar a população LGBTQIA+ sobre seus direitos e incentivar a busca por proteção. “O controle social, por meio da atuação de organizações da sociedade civil e órgãos de fiscalização, também será fundamental para garantir que a decisão seja cumprida de maneira eficaz”, afirma.

O julgamento do STF também pode abrir precedentes para outras mudanças legislativas voltadas à ampliação dos direitos da comunidade LGBTQIA+. Vieira destacou que a decisão pode influenciar debates sobre regulamentação do nome social, adoção por casais homoafetivos e fortalecimento do combate à discriminação institucional.

“Esse precedente pode servir de base para o aprimoramento de políticas públicas, como a criação de centros de acolhimento específicos e maior representatividade nos órgãos de proteção”, diz.

Foto de Rebecca Moura

Rebecca Moura

Estudante de Jornalismo pela Universidade Federal de Alagoas e colaboradora no portal Eufêmea, conquistou o primeiro lugar no Prêmio Sinturb de Jornalismo em 2021. Em 2024, obteve duas premiações importantes: primeiro lugar na categoria estudante no 2º Prêmio MPAL de Jornalismo e segundo lugar no III Prêmio de Jornalismo Científico José Marques Melo.