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Ela saiu da roça, trabalhou como faxineira e hoje é administradora especialista em pessoas

Por Cecília Calado

A Administração sempre representou uma oportunidade de transformação de vida para Jocely Ferro, uma alagoana que cresceu em uma casa de taipa na zona rural de Paulo Jacinto. Desde cedo, ela ajudava seus pais nas tarefas da roça.

No entanto, aos 14 anos, Jocely tomou uma decisão corajosa que mudaria seu destino: deixar o sítio em busca de independência financeira. Naquela época, a perspectiva de uma graduação parecia distante e até mesmo concluir o Ensino Médio era um desafio que parecia inalcançável.

“Eu não tenho herança para você”

Superando o determinismo social da época, Jocely resolveu abandonar a enxada para tentar uma vida de oportunidades na cidade. Em Palmeira dos Índios, morou na casa dos seus patrões, dos 14 aos 17 anos, conciliando a escola com o trabalho como faxineira e babá.

“Quando eu resolvi sair de casa, o meu pai disse uma frase que ficou na minha memória: Minha filha, vá! Agora estude, porque o estudo é a única coisa que você vai ter. Eu não tenho herança financeira para deixar para você”, relembra ela. Com a voz do pai ecoando na memória, a resistência para não abandonar os estudos ficava cada vez mais forte.

Ao alcançar a maioridade, a rota precisou ser recalculada. Mudando-se para Maceió, o emprego também mudou. Agora, Jocely encarava o comércio, nos supermercados e shoppings, e as empresas do setor de telecomunicações.

Contudo, isso ainda não era o suficiente para uma mente inquieta como a dela. “Não queria permanecer nesses trabalhos sem qualificação, então pensei que já era hora de iniciar uma graduação. Foi assim que eu consegui o Prouni para fazer Administração depois de 9 anos fora da sala de aula”.

Segundo ela, a escolha pelo curso de Administração se deu pela abrangência no mercado de trabalho e por gostar de cuidar de pessoas. No início, esse cuidar era associado à área de saúde, mas após um tempo, percebeu que na Administração esse cuidado também poderia ser aplicado através da gestão de pessoas, e foi justamente nessa área que ela resolveu se especializar.

“Precisava me dedicar mais que a maioria”
Foto: Cortesia

Durante a graduação, outros desafios apareceram. Além de lidar com a dupla jornada entre o emprego e a faculdade, Jocely não podia perder matérias por causa da bolsa do Prouni. No entanto, o fato de ter estagnado os estudos durante tantos anos trazia dificuldades na  assimilação dos conteúdos.

“Me sentia velha na faculdade. Eu não lembrava de fórmulas de matérias de base como Matemática, Estatística e Economia, então eu precisava me dedicar mais que a maioria da turma”, desabafa ela.

Hoje, Jocely Ferro além de ser administradora é, mentora e coach de carreira, consultora de recursos humanos, analista comportamental e coautora do livro “Cresça e Aconteça: 24 Chaves para o seu Desenvolvimento Profissional”. Através das consultorias, ela propõe aos empresários que para desenvolver os negócios, é preciso primordialmente desenvolver as pessoas.

“Isso faz parte de um planejamento estratégico. Por trás de um sistema financeiro tem pessoas, por trás de qualquer negócio quem move são as pessoas, então o principal capital de uma empresa é o ser humano”,  explica ela.

“Achavam que eu tinha uma doença contagiosa”

A história de Jocely não se limita a isso. Sua aceitação em relação ao vitiligo também serve de inspiração para outras mulheres.

As primeiras lesões na pele de Jocely apareceram com 5 anos de idade. Para a família, a doença era desconhecida e pagar a um especialista para entender o caso fugia da realidade financeira. Desse modo, a falta de informação prevaleceu e o bullying se fez presente em boa parte da sua infância/adolescência.

“Na escola eu era apelidada por besta pampa, pintadinha ou até manchadinha. Lembro que às vezes eu queria dormir na casa de alguma colega, mas nunca conseguia, porque a mãe dela achava que eu tinha uma doença contagiosa”, relembra ela.

A falta de informação ainda persiste. Os olhares e as receitas de cura não pararam de aparecer, mas ela resolveu encarar o vitiligo de forma natural e leve, e sempre que tem oportunidade, fala sobre a doença e desmistifica esses estigmas. Essa maneira de lidar com a doença tem, inclusive, inspirado outras mulheres a se aceitarem e, consequentemente, mostrar mais o seu corpo.

“Eu me mostro mesmo para que as pessoas enxerguem outras possibilidades e percebam que podem viver tranquilamente com isso, coloco meu short e vou correr na praia e vou  para qualquer canto desse jeito. Eu até esqueço que tenho vitiligo”, afirma Jocely.