Quem foi que disse que para uma mulher ser feliz precisa ser mãe? Quem foi que disse que uma mulher precisa ter filhos? De alguma forma, falar sobre mulheres que não pensam na maternidade ainda choca a sociedade que julga essa escolha. O Eufemea entrevistou a administradora Gabriela Rayne, 29 anos, e a psicóloga Anna Carolina Guedes que não se conhecem, mas que possuem algo em comum: elas não desejam filhos.
Uma pesquisa global realizada pela farmacêutica Bayer, com o apoio da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e do Think about needs in Contraception (Tanco) mostrou que 37% das mulheres do Brasil não querem ter filhos.
Mas afinal, o que pensam essas mulheres que dizem não à maternidade? Segundo a psicóloga Perinatal e Parental, Anna Guedes, ela não quer ser mãe porque não tem o desejo de dedicar parte da vida dela à responsabilidade da função materna.
Já Gabriela reforça que um dos motivos que ela não quer ter um filho é para que ele não tenha contato com a mãe e não sofra o que ela sofreu. Além disso, ela não acredita que o mundo de hoje seria um lugar para a criança.
Outro fator que a faz não querer ter filhos é a perda da liberdade. “Quando se tem filhos você vive quase que exclusivamente para eles e é pra vida toda. E eu sinto muito medo de ser uma mãe tóxica como a minha foi”.
E quando se diz que não se deseja ter filhos, as perguntas aparecem. Essas perguntas evidenciam o julgamento social que as não mães podem sofrer ao longo de suas vidas.
Segundo Ana, quando ela informa que não tem desejo de ser mãe, ela ouve revolta. “Muita gente diz: ‘não diga isso, Deus castiga’”. Mas ela enfatiza que tem o direito de escolha dela.
“Aí começam a perguntar: ‘mas porque você não quer ser mãe?’, acompanhada de uma descrença na minha opinião, que é baseada em um senso comum de que “você diz isso agora, mas vai mudar de opinião quando o instinto materno surgir” e do maior choque possível com a ideia de “como assim, você trabalha com mães e não quer ser mãe?”, contou.
Mas Anna reforça que o trabalho dela não é baseado na experiência pessoal. “Ao trabalhar com perinatalidade e parentalidade eu preciso, além de viver dentro dessa pressão, estudar sobre a maternidade compulsória. Ainda é muito forte a ideia errônea da existência de um “instinto materno” e com isso da obrigatoriedade da mulher querer e gostar de ser mãe”, explicou.
De acordo com ela, o acesso à informação tem ajudado para que a mulher se questione e entenda de onde vem os seus desejos. “Mesmo assim, ainda não é um número significativo da população feminina que pode fazer essa reflexão. E as poucas que entendem e posicionam o seu não-desejo pela maternidade, infelizmente, são julgadas como amarguradas, más, incompletas e infelizes. Como se houvesse um problema por não querer ter filhos, e não há”.
Por fim, Gabriela acredita que as pessoas ainda acreditam que é preciso deixar “uma prole antes de partir”. “Deixar sua semente na terra. Além disso, ainda existe a crença de que a mulher só será feliz se casar e tiver filhos”.
Anna diz que o caminho da busca pelo respeito — corpos, desejos, ideias, vozes — para essas mulheres ainda é longo, mas que ele deve passar pela luta contra a maternidade compulsória.